Palestra
ministrada em 04 de agosto de 2012.
Gostaria
de começar apontando que o filme me surpreendeu. Ainda bem que o
Gabriel nos avisou que haveriam cenas fortes. Ufa. Já fiquei
preparada. Gostei do tema, de questões e paralelos que a Maria Rita
fez. “O Corpo” é o tipo de filme que se descobre novas relações
a cada vez que se assiste.
Ela
começou relacionando o tema do filme com a nossa história, com o
passado e a atualidade. Falou do esquecimento, da indiferença, da
mortalidade que continua depois da ditadura. Referenciou logo o livro
de ensaios “O que resta de ditadura” com o texto escrito pelo
Paulo Arantes, “1964, o ano que não terminou” e nos questionou,
o que herdamos? A Maria Rita frisou que somos o único país que não
puniu quem matou na ditadura e que temos mais mortandade hoje do que
naquela época.
Ela
trouxe a tona a barbariedade de
maio de 2006, em que ocorreram atos
de violência em São Paulo causando inúmeras mortes. O grupo civil
“Mães de Maio” acompanha as investigações e exige respostas
ainda hoje.
Refletindo
sobre o filme, ela afirmou que Laura, a chefe de Artur estava mais
morta do que o protagonista; e como os mortos anônimos são tratados
como algo banal. Artur começa a viver quando começa a se preocupar
com algo. Artur como uma figura quixotesca.Teresa representa a
geração que não quer saber de nada e a seguinte. Fernanda
histérica, não quer reconhecer o que já sabe. Ela é a falsa boba,
podendo o espectador perceber a mudança no seu comportamento quando
se dá conta.
Fernanda
transgride (rouba) e representa a morte da mãe. Fernanda ainda tem
a sua história roubada, como os casos na Argentina, de crianças que
eram dadas para a adoção na época da ditadura. Seguriu que
víssemos
“O dia em que não nasci”, filme argentino e alemão.
Com um
discurso em tom de crítica, difícil não assumir esse lugar quando
se fala de algo tão revoltante, relembrou o
Shibata que assinava os
atestados de suicídio de torturados da ditadura, prática que
continua nos dias de hoje. Um país inteiro silenciado.
Falou
ainda do policeticismo pragmático herdado dessa época, da sociedade
que não quer nomear seus mortos. Diagnóstico de
melancolia de
Walter Benjamin, indolência do coração, rompendo com a sua
história. Sintoma social. Trair a sua origem, a sua causa.
Mencionou, também, o estado de depressão, aquele que trai o seu
desejo (Lacan).
Durante
as perguntas, surgiu a questão sobre se vivíamos uma ditadura nos
dias de hoje. A Maria Rita Kelh fez questão de dizer que não
vivemos uma ditadura, se assim fosse, ela não poderia estar ali
falando aquelas coisas. Viveríamos com medo de falar.
Foi
suscitado ainda se a juventude de hoje não vivia a política do
querer “se dar bem”, passando em concurso público para ganhar em
cima do Estado; e a Maria Rita bem frisou que isso é bem mais
antigo, estando presente nos textos de Machado de Assis.
O
totalitarismo é resultado da tentativa de implementar a utopia, e
ela sugeriu o amadurecimento da ideologia pela prática. Ressaltou
ainda que vivemos o período democrático mais longo, desde 1988.
Apontou, também, para a despolitização da sociedade, ou seja, não
se sabe de onde a opressão vem.
Já fazia
um tempo que eu não me empolgava com uma palestra dessa forma,
saindo com vontade de ler textos e aprofundar estudos ;)
Palestrante
Maria Rita Kelh doutora em Psicanálise pela PUC-SP,
escritora e integrante da Comissão da Verdade.